segunda-feira, 23 de abril de 2012

Democracia para totós


DIOGO GASPAR
Membro da Direção da ADLEI

«Eles trabalham todos os dias e nós, quando nos exigem um trabalho de quatro em quatro anos, faltamos». A afirmação é de Nilton, humorista português, na qualidade de participante no programa «Prós e contras», de 26-03-2012. Uns – mais distraídos – entendê-la-ão como uma tirada retórica, outros – os que vêm na abstenção uma forma de protesto – uma afirmação condescendente para com eles, os políticos. Certo estará que ela não deixa de expressar, com evidência, a imoral taxa de abstenção da nossa democracia, eminente chaga de cada ato eleitoral.

A abstenção eleitoral fere a legitimidade de decisões que exigiriam um amplo consenso popular. Abordar este problema é levantar a ponta de um véu (fácil de entender porque expresso pela estatística), das fraquezas da nossa democracia e, em especial, da falta de participação cívica.

Não duvidamos de que os cidadãos têm razões que bastem para desconfiarem das instituições e dos políticos, sobretudo numa altura em que, mercê da instabilidade financeira, periga a coesão social e se assistimos ao definhar da economia. Mas pior do que isso é verificar, no inventário das crises que atravessámos nas últimas décadas, que não aprendemos com os erros: ficamos com a sensação de que os sacrifícios que fazemos hoje não servirão para mudar o modelo de funcionamento do sistema: um interesse público funcionalizado por interesses materiais e uma democracia bloqueada por agendas de poder.

O país precisa de políticos determinados e de consensos alargados, não apenas para debelar crises, mas também para construir estratégias de desenvolvimento. Sem prejuízo de uma livre competição partidária, necessitamos de uma maior cooperação, firmado numa espécie de contrato social, nomeadamente no que toca à promoção da solidariedade intergeracional, evitando a exploração orçamental das gerações futuras. 

A democracia não se esgota nos partidos, mas a sua reciclagem é essencial. Permitimos-lhes que procedessem à sovietização do regime, fazendo do Parlamento o seu monopólio e da Administração Pública a sua coutada. Os partidos, enredados na malha das clientelas, têm de auscultar a sociedade civil e especializar-se na produção de ideias, fazendo do Parlamento não uma uma caixa-de-ressonância do Governo, mas antes o seu pulmão. 

Daqui a dois dias, quando escutarmos os discursos de comemoração sobre o 25 de Abril, deveríamos interrogar-nos sobre estes problemas. E evitar que eles continuem sem resposta. A bem da democracia (também) é esse o nosso papel.

in Diário de Leiria, 23 de abril de 2012

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Memorando da ADLEI para a Sra. Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território

Memorando apresentado e entregue em mão à Senhora Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território Prof. Dr.ª Assunção Cristas, aquando da sua visita a Leiria, no âmbito do Jantar-Conferência da NERLEI, Novos desafios para o setor agroalimentar


As prioridades abaixo listadas constituem algumas das áreas estratégicas que merecem a maior atenção da ADLEI e um alargado consenso por parte de entidades públicas e privadas da Região de Leiria, sendo consideradas de relevante importância para o desenvolvimento da Região de Leiria e o seu contributo para o País.


1 – TERRITÓRIO

Aspetos relevantes:

- Legislação aplicável nas áreas do ordenamento, planeamento, licenciamento, construção, é constituída por milhares de diplomas, em muitos casos contraditórios entre si, imprecisos na linguagem e nos conteúdos.

- Planeamento. Não existe a desejável integração de conhecimentos, de propostas, de gestão no terreno entre os vários níveis de intervenientes nem entre as diferentes figuras de planos.  

Propostas: 

- Proceder à compatibilização e síntese de todo o acervo legislativo aplicável, estabelecendo uma calendarização rigorosa e responsabilizante, com a participação das entidades públicas e privadas envolvidas.

- Proceder à efetiva coordenação de entidades públicas e privadas, na horizontal e na vertical, de figuras e de planos em elaboração ou já eficazes, por forma a garantir uma efetiva coordenação de objetivos e resultados, a favor da requalificação do território, do bom e cómodo desempenho das atividades, da qualidade de vida dos Cidadãos.


2 – AGRICULTURA

Aspetos relevantes:

- Produção. Existe grande potencial produtivo no sector agrícola da Região de Leiria, que foi vitimada por políticas e objetivos económicos e financeiros errados e causadores da gigantesca dependência e défice alimentar de Portugal.

- Distribuição e preço dos produtos agrícolas no produtor estão esmagados pelo capital financeiro que domina a distribuição até ao consumidor final. Os produtos portugueses sofrem uma concorrência desleal, em qualidade e preço, de produtos oriundos de outros continentes com condições laborais e sociais deploráveis, humanamente indignas.
  
Propostas:
 
- Definição participada de políticas incentivadoras da produção agrícola; tomar o Perímetro de rega do Vale do Liz como área estratégica e exemplar para a produção agrícola, retomando os projetos já existentes para aumento da produtividade destes campos do Liz. Promoção de uma nova Lei das Sesmarias adaptada aos condicionalismos presentes mas igualmente orientada para eliminar o abandono das terras e promover valor na produção agrícola.

- Assumir e exercer a regulação do sector agrícola, que apenas compete e é exigível à governação nacional, por forma a retribuir ao produtor o justo valor dos seus produtos na cadeia da distribuição até ao consumidor final. 

3 - AMBIENTE

Aspeto relevante:

- Suinicultura. O ineficiente tratamento dos efluentes desta atividade pecuária, constitui um grave problema para os solos, águas de superfície e não só, a qualidade do ar, que se torna irrespirável em vastas áreas da região, percetível, até quando se circula na rede rodoviária. Constitui um evidente constrangimento para os cidadãos e o turismo. Esta atividade pecuária possui grande interesse para a economia da Região e do País, deficitário também em carne de suíno e seus derivados.

Proposta:

Retomar projetos e políticas já definidas e dar-lhes execução, para completa resolução deste grave problema ambiental que afeta extensas áreas da região.

4 – MOBILIDADE REGIONAL, INTER-REGIONAL E INTERNACIONAL

Aspeto relevante:

- Acessibilidade nacional e internacional. A região de Leiria possui fortes fluxos anuais de passageiros, na ordem de alguns milhões. Se do ponto de vista rodoviário está bem servida, nas modalidades da ferrovia e do transporte aéreo poderia estar bem melhor e com grandes ganhos para a região e o País. 

Propostas:

- Linha do Oeste. Assumir a Linha do Oeste como importante e decisiva infraestrutura de transporte de mercadorias (a Região é fortemente exportadora e a ferrovia é rentável) e de passageiros. Requalificar a infraestrutura e o material circulante desta linha, que interessa uma rede urbana que vai de Lisboa a Torres Vedras, Caldas da Rainha, Leiria, Figueira da Foz, Coimbra. É um importante subsistema urbano com forte expressão económica e populacional à escala nacional.

- Aeroporto de Monte Real. Disponível para servir de plataforma aérea para o Oeste e Centro, capaz de servir milhões de passageiros. Implementação deste aeroporto também como infraestrutura civil.

O Presidente da Direção da ADLEI,
José Charters Monteiro
Leiria 12 de Abril de 2012

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Cidadania e ambiente

CLÁUDIO DE JESUS
Membro da Direção da ADLEI

Há alguns anos atrás, numa apresentação para alunos universitários, exemplifiquei com recurso a três exemplos, inadequadas práticas de cidadania para com o meio ambiente.

E os três exemplos foram: cascas de tremoços e pevides, maço de cigarros amachucado e fralda descartável já usada – todos atirados para o chão ou pela janela do automóvel! A estes exemplos poderíamos somar diversos outros, desde o clássico cuspir para o chão, apertar violentamente a buzina do automóvel (a propósito, já alguém ouviu buzinar num país nórdico?) ou mesmo deixar o cocó do cão no meio do passeio.

Todos os leitores se recordarão de ter vivenciado pelo menos uma vez na vida este tipo de práticas que, infelizmente, não parecem ter mudado muito com o passar dos anos. Se assim não fosse, não continuaríamos a ter rios poluídos (e o exemplo do Lis é bem gritante), empresas a tentar contronar encargos com sistemas de protecção ambiental (evitando investimentos em estações de tratamento de águas residuais, filtros e despoeiradores e sistemas de atenuação de ruídos).

Em 2003, a empresa regional de tratamento de resíduos sólidos urbanos, em colaboração com as Escolas Secundárias da Marinha Grande e de Vieira de Leiria, organizou uma marcha pela natureza, apelando acima de tudo, à melhoria de comportamentos cívicos dos condutores e transeuntes da estrada nacional que liga Marinha Grande a Vieira de Leiria. Resultado dessa ação? 1500 quilos de resíduos recolhidos das bermas da estrada numa manhã de trabalho levado a cabo pelos voluntários (alunos e professores) das citadas escolas. Trabalho meritório sem dúvida, mas que de pouco vale se não formos capazes de incutir nos jovens de hoje, que serão adultos amanhã, valores consentâneos com a expressão “bons cidadãos ecológicos”

E como é que isso se consegue? Com muita sensibilização e educação, sobretudo da população em idade escolar, pois jovens com hábitos ambientalmente saudáveis são o garante de um país e de uma região com futuro, salvaguardando a qualidade ambiental dos locais onde terão de viver as próximas gerações. Pensemos nisto, verão que nada custa melhorarmos os nossos hábitos quotidianos em troca de um futuro mais são e equilibrado.

in Diário de Leiria, 9 de abril de 2012