DIOGO GASPAR
Membro da Direção da ADLEI
«Eles
trabalham todos os dias e nós, quando nos exigem um trabalho de quatro
em quatro anos, faltamos». A afirmação é de Nilton, humorista português, na
qualidade de participante no programa «Prós e contras», de 26-03-2012. Uns –
mais distraídos – entendê-la-ão como uma tirada retórica, outros – os que vêm
na abstenção uma forma de protesto – uma afirmação condescendente para com eles, os políticos. Certo estará que ela
não deixa de expressar, com evidência, a imoral taxa de abstenção da nossa
democracia, eminente chaga de cada ato eleitoral.
A abstenção
eleitoral fere a legitimidade de decisões que exigiriam um amplo consenso
popular. Abordar este problema é levantar a ponta de um véu (fácil de entender
porque expresso pela estatística), das fraquezas da nossa democracia e, em
especial, da falta de participação cívica.
Não
duvidamos de que os cidadãos têm razões que bastem para desconfiarem das
instituições e dos políticos, sobretudo numa altura em que, mercê da
instabilidade financeira, periga a coesão social e se assistimos ao definhar da
economia. Mas pior do que isso é verificar, no inventário das crises que
atravessámos nas últimas décadas, que não aprendemos com os erros: ficamos com
a sensação de que os sacrifícios que fazemos hoje não servirão para mudar o
modelo de funcionamento do sistema: um interesse público funcionalizado por
interesses materiais e uma democracia bloqueada por agendas de poder.
O país
precisa de políticos determinados e de consensos alargados, não apenas para
debelar crises, mas também para construir estratégias de desenvolvimento. Sem prejuízo
de uma livre competição partidária, necessitamos de uma maior cooperação, firmado
numa espécie de contrato social, nomeadamente no que toca à promoção da
solidariedade intergeracional, evitando
a exploração orçamental das gerações futuras.
A democracia
não se esgota nos partidos, mas a sua reciclagem é essencial. Permitimos-lhes que
procedessem à sovietização do regime, fazendo do Parlamento o seu monopólio e
da Administração Pública a sua coutada. Os partidos, enredados na malha das
clientelas, têm de auscultar a sociedade civil e especializar-se na produção de
ideias, fazendo do Parlamento não uma uma caixa-de-ressonância do Governo, mas
antes o seu pulmão.
Daqui a dois
dias, quando escutarmos os discursos de comemoração sobre o 25 de Abril,
deveríamos interrogar-nos sobre estes problemas. E evitar que eles continuem
sem resposta. A bem da democracia (também) é esse o nosso papel.
in Diário de Leiria, 23 de abril de 2012
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